[vc_row][vc_column width=”2/3″][vc_column_text]Por Murilo Mellins

– Ivan, vamos dar um passeio de bonde?
– De bonde, Murillo?
– E por que não? Você perdeu a imaginação?
Vamos ao Bairro Industrial no bonde da linha número 1, embarcando aqui no Centro, na esquina da Sorveteria Primavera. Inicialmente, em busca da zona sul, passamos pela Praça Fausto Cardoso, dobramos a praça no Rubina Hotel e depois o Hotel Sul Americano. Avistaremos a Ponte do Imperador e viramos em busca da Rua da Frente e nela seguimos olhando o Rio Sergipe de um lado, e, do outro, as construções do velho Atheneu Sergipense, Saboaria Aurora, o antigo Grupo Escolar barão de Maruim, palacete dos Rolemberg, Ponto do Tabuleiro da Baiana, Clube Esportivo Sergipanos, encontramos à esquerda o Cotinguiba Esporte Clube, seguimos pela Avenida Augusto Maynard, entramos na Praça Tobias Barreto, passamos pela Chefatura de Polícia, descemos a Rua de Itabaiana, atravessamos o Parque – onde estão o Aquário, o Tesouro do Estado e o Preço Fixo – continuaremos pela Rua Itabaianinha até o seu final. Atravessaremos a Avenida Coelho e Campos, vemos a velha Estação da leste, seguimos em frente pela Avenida João Rodrigues e aí, sim, estaremos entrando no Bairro Industrial. Avistamos aquele aterro inicial, cruzamos uma ponte e passamos pela Fábrica Sergipe Industrial, que vai estar a nossa direita. À nossa esquerda, pilhas de madeiras que serão transportadas em troles, irão abastecer as caldeiras que alimentam os motores da Fábrica de tecidos. O SAME está ali escondido, servindo aos idosos carentes. Grande obra da Igreja Católica, e fundado por Dom Fernando Gomes. Adiante um pouco, uma vila de boas casas ocupadas por operários e seus familiares e, no final do casario, uma capela onde o Padroeiro é São João Batista, sempre bem cuidada e a espera dos fiéis para a missa dominical. Vamos em frente, passamos o Grupo Escolar Augusto Ferraz e lá estava a garagem geral da Cia. de Bondes da Cidade, vinculada ao velho Serviço de Luz e Força de Aracaju, com sua usina movida á lenha que fornecia luz para cidade e força para movimentar os motores dos bondes. Ali, hoje, funciona uma dependência da Unit. Um bom e moderno colégio e um excelente Centro de Fisioterapia, onde professores, alunos e pacientes interagem, aliviando dores e devolvendo movimentos aos corpos acometidos por várias doenças motoras, e as paralisias de várias etiologias. O bonde prossegue em sua caminhada lenta, vagarosa e agradável. Chegamos ao final da Avenida João Rodrigues, vamos dobrar á direta, mas do lado esquerdo, ainda está bem firme a casa que por muitos anos abrigou a professora Pocidônia Bragança e seu irmão, Mons. Dr. Alberto Branca, professor ilustre e advogado que atuava de modo brilhante no fórum sergipano.
Nosso bonde segue agora rumo a Avenida General Calazans e, em um trecho amplo, roda paralelo à Fábrica Confiança, com aquele cheirinho do algodão, característico das fábricas têxteis. É o reduto tradicional da antiga empresa Ribeiro Chaves & Cia., que teve à frente, por muitos anos, o grande administrador Dr. Joaquim Ribeiro. Passando esse trecho, dobramos a esquerda e vamos seguir a Avenida General Calazans, em direção a velha construção da Chica Chaves, ponto final da linha do bonde, onde abriga o Seminário Menor Arquidiocesano Sagrado Coração de Jesus.
Olhando aquela praia vimos algumas canoas ancoradas, pescadores consertando as velhas redes de arrasto, e em nossas divagações, lembrando quando aquele recanto bucólico recebia, aos domingos e feriados, centenas de pessoas que iam se banhar nas águas limpas do Rio Sergipe. Lembramos também de moradores ilustres que residiam no Bairro industrial, tais como, Dr. Alberto Bragança, Dr. Lourival Bonfim, Dr. Joaquim Ribeiro, Renato Nabuco, Sr. Buch, Sr. Luiz Eugênio de Moura, dono do melhor e mais sortido armazém de secos e molhados, e pai do nosso amigo Dr. Paulo Moura, que ali passou sua infância e juventude; do querido e respeitado delegado de polícia José Correia de Araújo; o piloto de avião conhecido como Araujinho; do Sr, Moisés, motorneiro do bonde-prancha e motorista do primeiro carro fúnebre de Aracaju e pai de Geovani, tipo popular conhecido como Professor “Bardal”; Wilson Moura, ex-operário, líder político e vereador; do conhecido pescador “Carapeba”, pai de Gervário, o “Careca”, comunista convicto que iniciou sua militância no Partido Comunista Brasileiro (PCB), espelhando-se nos grandes líderes trabalhadores das fábricas. Bairro Industrial das célebres e agitadas greves e movimentos políticos dos operários que reivindicavam salários justos e melhores condições de trabalho. Lembramos também do Cinema do Parque, com seus bancos de madeira; do Cine Confiança; do simpático Clube Aracaju, que proporcionava aos seus sócios animados bailes, e, com suas regatas, disputava juntamente com o Sergipe e o aCotinguiba os campeonatos municipais; do primeiro time de futebol do bairro, o da Fábrica Sergipe Industrial, com seus atletas: Alumínio e Timbala; do voleibol com sua principal levantadora, a operária Risolina; da Associação Desportiva Confiança, fundada pelo seu patrono, Dr. Joaquim Ribeiro; do basquetebol, dos atletas: Alfredo Souza, Wilson Moura, Bazinho e Zé Mocinho. Bairro Industrial da rua Altamira, rua do Bode, rua Santa Cruz do Lamagar, rua Ouro Preto, rua do Vai Quem Quer. Bairro Industrial das belas operárias que, nas festas juninas, animavam com seus requebrados e olhares brejeiros, perfumadas com cheiros baratos, os sambas de roda e de coco, estalando seus tamancos, despertando olhares lascivos nos homens.
É hora do “bonde dos namorados” voltar. O condutor e o motorneiro viram os bancos e o arco que leva energia para o velho motor “Siemens” que rodará de volta a Aracaju. E vamos, então, descortinar um novo amanhecer para o bairro tão carente de obras para o conforto e bem estar de seus moradores e dos que para ali se dirigem.
Inaugura-se uma obra de vulto, a chamada “Orla da Prainha do Bairro Industrial”. O bairro, depois de mais de cem anos, começa a receber as benesses da modernidade, suas casas vão ser melhoradas, o Estádio do Confiança vai voltar aos grandes dias, o turismo vai revolucionar a zona norte e a vida ter outro ritmo naquela parte tão tradicional de Aracaju.
O nosso bonde vai recolher. A história volta a fazer parte do nosso passado de boas e doces recordações, mas o presente é mais poderoso, é mais pungente. É vida nova no velho Bairro Industrial. Vamos fazer o retorno de automóvel, meu caro Ivan, pois o bonde do passado já passou deixando apenas boas reminiscências.[/vc_column_text][/vc_column] [vc_column width=”1/3″][vc_column_text] [/vc_column_text][/vc_column][/vc_row]

Comments are closed.