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Por Paloma Abdallah, jornalista da Fundação Hospitalar de Saúde

Na faculdade de Jornalismo, aprendemos os princípios da neutralidade, imparcialidade e objetividade. Ora, tenho tentado praticá-los nos meus três anos como repórter. No entanto, diante desta pauta, não consegui me manter isenta e escrever uma matéria apenas sob a ótica de reportar. Fiquei assustada ao me deparar com os números do Serviço de Atendimento a Vítimas de Violência Sexual. Mas, sobre esses dados, falarei depois. Nesse primeiro momento, preferi me ater a alguns relatos.

Foi na Maternidade Nossa Senhora de Lourdes, em Aracaju, onde o serviço é oferecido, que me deparei com muitas histórias que não gostaria de ouvir. Soube que uma menina de 13 anos engravidou do próprio pai, após ter sofrido uma série de abusos. Ele foi preso. O bebê, para a adoção. Também foi lá que tomei conhecimento que outra adolescente da mesma idade engravidou do irmão mais velho, 15 anos. Por ter chegado ao serviço de atendimento no tempo correto, a gravidez foi interrompida.

Ainda no consultório, ouvi o relato do drama de uma mãe ao assistir um vídeo da filha de 14 anos fazendo sexo oral em um vizinho. Moradora de um município do Baixo São Francisco, a menina foi ameaçada pelo jovem de 20 anos, se não o fizesse. O caso está sob investigação da polícia.  A mãe entrou em depressão depois de ver as imagens e saber que toda a cidade já tinha assistido ao vídeo. A filha não sai mais de casa com vergonha das chacotas que é obrigada a passar.

Dentre tantos casos, uma senhora resolveu conversar comigo sobre a história da filha. Fiz questão de não perguntar os dados básicos para qualquer entrevista: nome, profissão, onde mora. Garanti que sua identidade seria integralmente preservada. A única coisa que me interessava era o seu relato. Pois bem, conversamos por cerca de 30 minutos e, mesmo acanhada, contou como tudo aconteceu.

No início do período escolar deste ano, a escola que a filha da minha entrevistada estudava contratou um novo professor de matemática. O rapaz de 26 anos começou a trocar olhares com a aluna de 13. Um mês após o início das aulas, ele a convidou para sair. Alegando que não poderia ser visto acompanhado da aluna, o local marcado foi uma pousada. “Se ele não quisesse mal a minha filha, tinha marcado com ela na praça”, disse a mãe.

No primeiro encontro, o professor manteve relações sexuais com a menina. “Ele fez questão de dizer que tinha carro, apartamento e ia levar a menina para morar com ele. Depois do encontro, o professor passou a não atender mais as ligações. Uma professora ficou sabendo e contou a dona da escola. Por ter sido sempre uma mãe presente, a dona me chamou para conversar. Meu marido não queria, mas eu resolvi levar o caso para frente”, conta.

A mãe de duas filhas foi à delegacia e ao conselho tutelar denunciar o caso. “Minha menina queria que eu deixasse isso de lado. Na verdade, ela quer que a entregue para ele. É incrível como ela o defende. Por mais mal que ele tenha feito, minha filha não percebe”, relata.

No entanto, mesmo com o consentimento da criança o ato configura-se crime de acordo com o artigo 217 alínea A do código penal. “Para a criança ou adolescente com menos de 14 anos, há violência presumida. Ou seja, mesmo que seja com o consentimento da parte, a lei entende que houve o estupro presumido. Se for condenado, o acusado pode pegar a pena de reclusão de 8 a 15 anos”, explicou o advogado Thiago Oliveira.

A enfermeira obstetra do serviço, Dora Varjão, explicou que neste caso a menina não se sente vítima. “Isso acontece quando há um envolvimento amoroso entre os dois. A família, a justiça, o serviço sabe que ela é vítima. Mesmo que a menina não queira, é preciso levar o caso adiante. A Lei exige que leve adiante”, frisou.

E a mãe quer levar adiante. Quem sabe para tentar minimizar a culpa que, apesar de não ter, ela sente. “Sempre fui uma mãe presente. Quando brigo com o meu marido, ele faz questão de dizer que a culpa é minha. Eu fico me perguntado se eu tivesse ido atrás dela no dia que me disse que ia pegar um livro na casa da colega e demorou mais do que o normal, conseguiria evitar isto tudo?”, se questiona.

Apesar de querer que a justiça seja feita, a mãe acredita mesmo na justiça divina. “Minha filha foi criada segundo o Evangelho. Deus sempre esteve nas nossas vidas”. A dor aumenta quando escuta os comentários dos conhecidos. “O pior é ouvir as pessoas dizerem ‘bem pregado. Sempre prendeu a menina’. Isso me dói. Fica difícil reconstruir a vida assim”, me disse a mãe antes de pegar a bolsa preta e ir ao encontro da filha que esperava ser atendida pela médica da maternidade.

A parte das histórias, encerro por aqui. Confira a reportagem produzida sobre o Serviço de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual.

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