Nota de pesar: Djenal Nobre
O Instituto Marcelo Déda lamenta o falecimento do pedagogo Djenal Nobre Cruz, membro fundador do Partido dos Trabalhadores e um dos pioneiros na militância do movimento negro em Sergipe na década de 1980. Nascido em 17 de janeiro de 1956, em Aracaju, Djenal foi coordenador de políticas de promoção da igualdade racial da Prefeitura de Aracaju na gestão Marcelo Déda.
Na obra “Histórias do movimento negro no Brasil: Depoimentos ao CPDOC”*, de Verena Alberti e Amilcar Araujo Pereira, Djenal narrou:
“(…) Djenal Nobre Cruz, figura importante no movimento negro de Sergipe, onde fundou o Partido dos Trabalhadores, relata como o contato com a publicação foi importante para a definição de sua atuação política:
Angola tinha sido liberta em 1974, mais ou menos, e eu tinha um livro de Agostinho Neto chamado Poemas de Angola, que eu li e me impressionei com os poemas, achei fantásticos os poemas. Então, a partir daí eu disse: “Eu tenho que fazer uma opção de luta.” Já tinha uma opção política, mas tinha que ter uma opção de luta, tinha que focar. A partir daí eu comecei a descobrir essa questão racial.
Pergunta – Como o senhor chegou a esse livro do Agostinho Neto?
A gente já tinha uma discussão política e tinha uma opção solidária à Angola, à libertação. (…) E esse livro de Agostinho Neto circulava no meio para debater os poemas, para recitar os poemas, e eu comecei a ficar interessado sobre isso. E adorei isso. Comecei a me descobrir como negro nessa trajetória política. Aí eu disse: “Tenho que fazer uma opção. Ficar com a minha opção política, mas focar a minha luta dentro do movimento negro de Sergipe.”
(…) No momento que se discutia a questão da Anistia, aquele projeto de Anistia da ditadura, havia uma efervescência cultural muito forte e rolava muita coisa de fora. As guerras africanas estavam na moda, todo mundo sabendo o que estava acontecendo, a libertação dos países africanos.
E tinha uma livraria, que era a livraria do Bosco Rolemberg, do PC do B. Ele era uma figura do partido que foi preso na época da ditadura. Voltou e botou essa livraria. Todo sábado ele tocava violão e dizia assim: “Todo sábado à tarde a batidinha de bebida eu dou, vocês vêm aqui, lêem um livro, debatem e vão embora.” Ele fazia com o maior prazer isso.
Pergunta – Ele era branco?
Negro. Então acostumou todo mundo a entrar lá às três da tarde do sábado, ele tocava violão, e a livraria assim pequenininha. Tinha um livro e a gente falava: “Veja aquele livro ali.” E nesse momento a editora do Pasquim lançou um livro de Angola, a editora Codecri lançou um livro desse tamanho assim, branquinho. Naquele momento a Brasiliense também lançou O que é?, O que é socialismo?, foi um momento muito interessante. Então estava na prateleira Angola. Peguei para ler. Aí passei uma semana com o livro, ele me emprestou. Voltei outra vez e comprei o livro depois.
Eu tenho esse livro até hoje. Comprei o livro depois e foi isso que me interessou muito. E o debate lá era um debate político, todo mundo de esquerda, e a gente discutia tudo, discutia a Revolução Angolana, a Russa, Anistia, era um caldo cultural muito grande. Eu fui um privilegiado. Pouca gente teve esse privilégio lá em Aracaju, de estar convivendo com essas figuras que tinham um acúmulo de discussão muito grande em Sergipe.”
* Fonte: Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil – CPDOC / FGV – www.cpdoc.fgv.br