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Um grupo de mulheres do Alto Sertão sergipano resolveu tirar do baú a sua história que ganhou o mundo e conquistou um prêmio. Esse grupo é formado por trabalhadoras rurais do povoado Lagoa da Volta, em Porto da Folha, que no último dia 13, viajou a Brasília para receber o prêmio ”Mulheres rurais que produzem o Brasil Sustentável”, pelo trabalho “Associação de Mulheres resgatando a sua História”. 

Elas concorreram com outros 516 grupos de todo o País e venceram com a história de superação, organização e muita luta. A premiação é da Secretaria Nacional das Mulheres da Presidência da República, que em Sergipe foi divulgado pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SEPM).

A Associação das Mulheres de Lagoa da Volta fica no maior povoado de Porto da Folha e o segundo maior do Estado com cerca de  quatro mil habitantes. Localizado em meio à caatinga, a 196 quilômetros da capital. O grupo produz hortaliças, picles, doces e mel orgânicos e é o primeiro do Estado a ter em casa um fogão que utiliza o esterco como gás de cozinha.

A inscrição

O Centro Dom José Brandão de Castro (CDBJ), uma ONG com forte atuação no semiárido brasileiro,  inscreveu o trabalho junto à SPM-PR. Já a existência do prêmio  foi comunicada ao CDJBC pela SEPM, secretaria criada há dois anos pelo governo do Estado para implementar políticas públicas de gênero.  A secretária Maria Teles, assistente social  é a titular da pasta. “Temos um desafio enorme de garantir em todo o território sergipano, a implementação dessas políticas de forma transversal em todo o governo estadual por meio de parcerias entre as suas diversas instâncias e com as organizações da sociedade civil”, disse Maria Teles.

A coordenadora da associação, Luzinete Dória, relembra que o primeiro passo para a conquista do prêmio foi dado quando um técnico do CDJBC esteve na associação para ouvir, escrever e inscrever no prêmio a história do grupo. “Quando recebi um email comunicando do resultado da premiação, ah! Meu Deus, foi uma grande alegria que compartilhei logo com as colegas”, relembra Dória que foi ao Palácio do Planalto acompanhada da filha Laís, para receber o troféu.

O trabalho “A Associação de Mulheres Resgatando sua História”, ficou entre os 30 finalistas e recebeu por essa colocação o prêmio. Outros 10 trabalhos de mulheres rurais conquistaram, além do troféu, R$ 20 mil em dinheiro. A solenidade de entrega aconteceu com a presença da presidente Dilma e da ministra da Mulher, Eleonora Menicucci.  Além da associação de dona Luzinete. Outro grupo, este de Poço Verde, acompanhado pela Emdagro, também foi premiado.

Uma história de desafios

A grande virada na história de vida daquelas mulheres começou em 1995 com a chegada da missão da Divina Providência.  Essa missão, com sede na Alemanha, era formada por  freiras da Igreja Católica, que chegaram a Porto da Folha com a incumbência de evangelizar, de melhorar as condições de vida daquelas famílias e resgatar a auto-estima das mulheres rurais. Dona Luzinete ressaltou que, juntamente com a Pastoral da Criança, a Divina Providência conseguiu reduzir a zero a mortalidade infantil, que era alta, naquele povoado.

Surgiram então as primeiras reuniões coordenadas pelas irmãs religiosas, até que em maio de 2003, um grupo de mulheres se sentiu forte o suficiente para formar uma associação, a Associação de Mulheres de Lagoa da Volta. No final deste mesmo ano, a Divina Providência vendo a evolução do grupo, cedeu o dinheiro para a compra de três tarefas de terra (1 hectare) e instalação da sede da associação, um galpão com cinco salas e área onde são cultivadas as hortaliças e onde fica o minhocário.  Em 2007, a associação fez o seu estatuto e se firmou como entidade rural.

Hoje, a associação conta com 30 mulheres que vencem o desafio de um solo castigado pela seca e de se mostrarem capazes para lutar contra as adversidades da vida. “Hoje nós somos uma família. Nos sentimos ’empoderadas’, disse dona Luzinete ao acrescentar que a auto-estima foi resgatada.

“Conseguimos esse prêmio e vamos conseguir muito mais”, complementou uma das fundadoras da associação e a única da vila a ter um fogão biodigestor, Maria Aparecida da Silva. Na semana passada, ela recebeu um telefonema que sinalizou a conquista de mais um prêmio, desta vez pelo pioneirismo de fazer um fogão que acende com gás obtido de esterco animal.

Desenvolvimento sustentável

A produção, sob forma de cooperativa,e os lucros obtidos pela associação ainda são pequenos.  Por mês são vendidas cerca de 3 mil balas de banana com doce-de-leite e uma média de 70 geleias e 50 compotas. O doce de umbu em calda e o de manga são a sensação da associação e, segundo dona Luzinete, fazem sucesso quando vistos – e saboreados.  Os doces e geleias são cozidos em ecofogões, uma espécie de fogão a lenha que nãosuja as panelas de fuligemnão agride a natureza (utiliza gravetos que caem ao chão e são recolhidos diariamente, sem precisar desmatar a caatinga para utilizar a lenha ou fabricar  o carvão).

 A venda do mel, piclese hortaliças é muito reduzida, mas as mulheres não desistem. “Ainda estamos começando. Investimos muito e hoje conseguimos tirar até R$ 80 por mês, cada uma, é pouco, mas estamos no começo. Vamos conseguir mais”, disse dona Luzinete cheia de otimismo e ávida por receber encomendas. A renda de tudo que é vendido pela cooperativa é repartida entre as mulheres que trabalharam na produção e 30% do lucro segue para a associação.

Como o solo é pobre, as mulheresaprenderam a produzir adubo orgânico, para enriquecer a terra ruim e garantir uma melhor produção sem agredir a natureza.  Fazem o biogel, remédio natural contra as pragas,e o húmus que retiram do minhocário. Com a técnica apreendida com técnicos do CDJBC, enriquecem o solo, e dele retiram alface, coentro e pimentão que vão para a mesa de cada uma delas e de moradores do povoado que compram a produção ainda incipiente.

Sertaneja usa esterco animal para cozinhar

No meio do sertão, de solo árido e rostos curtidos pelo sol, a sabedoria do sertanejo em vencer a seca se sobressai. É lá, em Lagoa da Volta, que uma das fundadoras da Associação de Mulheres de Lagoa da Volta, Maria Aparecida da Silva, construiu um fogão à gás de  esterco animal. Maria Aparecida é a primeira sergipana a ter um biodigestor em pleno funcionamento no quintal de sua casa.

De longe, a casa de Cida da Silva, como é conhecida na região, se destaca pelo jardim florido e animais nutridos.  Ela cria cabra e galinhas que fornecem, juntamente com o esterco de boi recolhido nas pastagens vizinhas, a matéria-prima do combustível que faz acender o fogão em sua cozinha.

“Em 2011, o Centro Dom José Brandão de Castro me levou pra um intercâmbio em Riachão do Jacuípe, na Bahia e lá eu vi um aparelho desses e fiquei pensando, porque não fazer um desses em casa. Gosto de ir pra esses lugares com um caderninho pra anotar tudo e não esquecer nada”, disse Cida da Silva.

E ela não esqueceu. Quando retornou, reviu as anotações e, com a ajuda de moradores, construiu o primeiro biodigestor de Sergipe. Um técnico do CDJBC finalizou o serviço e há cinco meses, Cida da Silva cozinha e aquece os alimentos para ela, o marido e os dois filhos com o gás que vem dos animais. Diariamente, ela abastece o tanque com um balde de esterco para garantir o gás e a chama acesa. “Tô economizando por mês R$ 40 do botijão de gás que comprava e ajudando a natureza”, disse a sertaneja de 48 anos que semana passada recebeu um convite para disseminar esse conhecimento com outros do sertão.

O biodigestor

O biodigestor é um equipamento que transforma esterco animal em gás inflamável e que pode substituir o GLP e ser usado nos serviços domésticos. Segundo Manual do Biodigestor Sertanejo, produzido pelo Projeto Dom Helder Câmara (PDHC), do Ministério do Desenvolvimento Agrário, em parceria com a Diaconia, uma ONG com atuação no sertão brasileiro, o biogás é uma mistura de vários tipos de gases.

O metano é o principal componente do biogás. Não tem odor, cor ou sabor e apesar de ter como fonte primária o esterco animal, não exala cheiro no local onde está instalado. Além disso, não desprende fumaça nem suja as panelas de fuligem.

O custo médio de instalação é de R$ 1,7 mil. Utiliza um tanque de cimento onde é colocado o esterco.  Apósa finalização da obra, basta alimentar o biodigestor diariamente com uma média de um balde de esterco por dia. Segundo o PDHC, os biodigestores não são novidades no Brasil e foram introduzidos tomando-se como base os modelos da China e Índia. Atualmente, o modelo mais usado é indiano.

Criando cabras e mudando o sertão

O Grupo de Criadores de Caprino do povoado Cacimba Nova, em Poço Verde, também viajou a Brasília e trouxe para casa o troféu “Mulheres rurais que produzem um Brasil Sustentável”. O trabalho inscrito pela Emdagro foi a ordenha das cabras para coleta e comercialização de leite esterilizado, além outros subprodutos como o iogurte, queijo e doces.

A associação produz mensalmente 900 litros de iogurte de leite de cabra, o equivalente a cinco mil saches por mês, que gera autonomia financeira de forma sustentável para as 18 famílias que fazem parte do grupo. Toda a produção de iorgurtes é destinada à merenda escolar por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), e a instituições de assistência social, através do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).

O grupo vende, também carne caprina, gerando uma média total de renda mensal para cada família de R$ 500. “Com o nosso trabalho a gente também promove uma distribuição de renda com outras pessoas da nossa comunidade, uma vez que utilizamos sua mão-de-obra no processo de produção e distribuição do iogurte, permitindo assim fixá-las cada vez mais na área rural de forma a evitar que elas se desloquem para a cidade em busca de trabalho”, afirma a responsável pelo grupo de mulheres, Ana Maria de Oliveira Souza Santos.

Ana Maria revela ainda que o próximo passo na qualificação do grupo será a obtenção do selo de certificação de inspeção estadual que dará condições de  grupo comercializar os produtos em outros municípios.

O Grupo de Criadores de Caprinos da Cacimba Nova, dentre outros parceiros, recebe o apoio do Governo do Estado de Sergipe, por meio da Empresa de Desenvolvimento Agropecuário de Sergipe (Emdagro), e da Empresa de Desenvolvimento Sustentável do Estado de Sergipe (Pronese). A Emdagro presta um serviço contínuo de assistência técnica e extensão rural através do seu escritório local de Poço Verde. Já o Pronese, investiu, através da Associação Comunitária do Povoado São José, R$ 69.681,80 para todo o processo produtivo que envolve a construção de oito apriscos, aquisição de 48 caprinos e aquisição de ensiladeira e iogurtadeira.

 

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