[vc_row][vc_column width=”2/3″][vc_column_text]Kadydja Borba, da Agência Aracaju de Notícias

Há um ano trabalhando, através do Ministério Público, na defesa dos direitos da criança e do adolescente, a promotora de Justiça Euza Missano já é uma das principais autoridades ligadas à área. Começou desenvolvendo trabalhos com adolescentes em conflito com a lei, e hoje exerce função no Núcleo da Criança e do Adolescente do MP. Em entrevista especial ao site do Cidade Criança da Prefeitura de Aracaju, Euza Missano fala sobre o seu trabalho e a política de assistência a criança e ao adolescente na cidade e no estado.

Agência Aracaju de Notícias – Como é definido o funcionamento das promotorias do Ministério Público na área da criança e do adolescente?
Euza Missano – Na instituição, existe o Núcleo da Criança e do Adolescente, que pertence ao Centro de Apoio Operacional do Ministério Público, ligado à Coordenadoria Geral, que controla todas as atividades do estado nesta área. Na capital, temos duas promotorias da criança e do adolescente. A primeira trabalha com crianças em situação de risco social e pessoal; e a segunda que trata das questões relativas ao adolescente em conflito com a lei. O Núcleo da Criança e do Adolescente trabalha também com as questões extra-judiciais, mesmo sem o promotor ter poder de execução, mas que estejam ligadas à política do menor e à aplicação do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). O núcleo fornece subsídios necessários para que os promotores da capital e do interior possam exercer as atividades ligadas ao ECA.

AAN – O Ministério Público trabalha com parcerias. Quais são os principais parceiros do MP?
EM – Na verdade, o Ministério Público é o fiscal da lei. Nós trabalhamos para verificar se o Estatuto da Criança e do Adolescente está sendo colocado em prática. Com isso, o MP tem criado grupos de estudo para conscientizar os agentes políticos, principalmente ligados ao estado e ao município, para a implantação de uma política de proteção integral da criança e do adolescente, determinada pelo estatuto.
Nós temos tido um excelente relacionamento com o município de Aracaju e com o estado, no sentido de que vários procedimentos administrativos estão sendo realizados para criar programas de retaguarda específicos na área de proteção da criança e do adolescente.

AAN – Quais seriam as principais conquistas do MP em relação à criança e ao adolescente?
EM – Este ano, o ministério deu um grande passo em prol da criança e do adolescente no estado de Sergipe. O município de Aracaju implantou programas de atendimento a este público, e que servem de retaguarda para os conselhos tutelares. Hoje nós já temos programas específicos destinados à família, à criança e ao adolescente em situação de risco.
Agora, há o entendimento de que a questão da criança deve ser trabalhada em co-gestão, com a participação dos governos federal, estadual e municipal. Este ano, nós tivemos um casamento de idéias, com a execução de programas ligados aos três setores. A sociedade também está mais conscientizada e se tornou uma importante parceira, talvez pelo trabalho do Ministério Público de massificação do estatuto.

AAN – A sociedade ainda tem muito a aprender?
EM – A sociedade precisa voltar seus olhos para a criança e o adolescente sem estigmatizá-los. Ela tende a olhá-los com assistencialismo, dando dinheiro ao menino que está no sinal, achando que com este ato cumpriu com a sua parte social, e vai para casa tranqüilo, sem refletir que aquele dinheiro pode ser usado para comprar cola de sapateiro ou para alimentar a ociosidade de um adulto que o obriga a pedir esmola como sustento da casa.
Por outro lado, a sociedade deve saber que pode contribuir para o Fundo Municipal da Criança e do Adolescente, ou para alguma instituição legal que reverta esta contribuição em atividades para estes jovens. O adolescente em conflito com a lei não deve ser visto como um criminoso que cometeu um ato infracional grave. É preciso que a sociedade se conscientize de que o estado vai fazer a parte dele, e de que o Ministério Público tem cobrado de forma insistente uma casa de ressocialização verdadeira para estes adolescentes, que quando saem dessa unidade são recebidos pela sociedade como marginais, e muitas vezes não conseguem emprego digno ou matrícula na escola. O MP luta para que esse preconceito acabe. A sociedade deve fazer a sua doação de maneira coerente e pensada.

AAN – Essa casa de ressocialização ainda não funciona de acordo com as exigências do MP?
EM – Não é o sistema ideal. Estamos ainda muito longe disso, pois nós temos uma unidade de recuperação que trabalha em cima do projeto arquitetônico do Código de Menores, totalmente ultrapassado, e que vai de encontro à nossa política diferenciada de crianças e adolescentes enquanto sujeitos de direito. Nesta unidade, ainda existem celas de contenção, e que hoje nós nem concebemos mais o uso do nome “cela”, mas sim de alojamentos dignos para que estes meninos possam se ressocializar. Todavia, existem técnicos competentes, que mesmo esbarrando com o projeto arquitetônico da casa, desenvolvem uma proposta pedagógica inovadora, que tem conseguido retirar alguns adolescentes do contato com a droga e da prática de atos infracionais.

AAN – Em relação aos projetos de retaguarda da Prefeitura de Aracaju, o que a senhora acha do Programa Cidade Criança?
EM – O programa é um avanço considerável. Há muito, a sociedade já merecia receber este tipo de programa para que desse uma retaguarda ao trabalho dos conselhos tutelares. A população ganhou com o Cidade Criança e a criação destes projetos, pois não adianta tirar o menino da rua, encaminhá-lo para o conselho tutelar, e os conselheiros não terem onde colocá-lo. Estes programas são necessários e devem estar integrados, como foi pensada a rede. O fato de toda secretaria ser da criança ajuda muito o trabalho do Ministério Público. A situação da criança e do adolescente não pode ser “departamentalizada”, daí a importância da Rede Cidade Criança, composta por uma equipe multidisciplinar com a articulação de todas as secretarias.

AAN – Por exemplo, durante um mapeamento de rua realizado pelo Projeto Meu Caminho, da Secretaria Municipal de Assistência Social, ficou constatado que mais da metade das crianças na rua vinha dos municípios que integram a grande Aracaju. Sendo assim, seria necessário um trabalho de integração entre as prefeituras destas cidades?

EM – Quando nós falamos do problema da criança, temos que esquecer a municipalização como “prefeiturização”. Não é isso. Crianças e adolescentes na rua provenientes da região metropolitana é um fato, e nós precisamos trabalhar nos municípios uma política de atendimento a estes jovens. Em função disso, o ministério promoveu na sexta-feira passada (dia 07) um encontro com representantes do estado e dos municípios de Aracaju, São Cristóvão, Barra dos Coqueiros e Nossa Senhora do Socorro. Estes municípios precisam se sensibilizar para criar seus próprios programas, ou identifiquem se estes programas já existem para atrair as crianças e os adolescentes de volta a seus municípios, ou ainda colaborar com os projetos de Aracaju para que esta possa receber os meninos de rua.

AAN – Há o interesse destes municípios em desenvolver programas na área da criança e do adolescente?
EM – Nós recebemos a visita dos secretários de Ação Social, que trouxeram material pertinente, inclusive para a criação do fundo municipal em seus municípios. O MP aposta que em 2002 este será o primeiro passo dado pelos municípios.

AAN – A criança pode ser considerada bem assistida em Aracaju?
EM – Costumo dizer que estamos com a “casa arrumada”. Precisamos agora executar os projetos que já temos. O município hoje está estruturado através de programas que devem ser testados. Devemos sair da teoria e ir para a prática. Por exemplo, a equipe que está em rua precisa fazer efetivamente a abordagem. São projetos muito bons, mas que precisam ser testados com uma abordagem ordenada e segura para que possamos apresentar resultados à sociedade.

AAN – A senhora está sempre em contato com as crianças e os adolescentes em situação de risco. Qual a opinião deles com relação a esta política de assistência desenvolvida no estado?
EM – É neste ponto que a sociedade precisa colaborar. Um menino que ganha R$ 10 por dia em um sinal, mesmo encantado com a escola, leva uma vida de adulto que precisa sustentar a sua família. Então, é difícil chegar para esta criança e conseguir colocá-la em um programa do município ou do estado que não vai contemplá-la com este dinheiro arrecadado no sinal. Esses meninos na rua precisam despertar uma consciência que só vai ser possível com a ajuda da sociedade para evitar que eles continuem na situação de mendicância, pedindo esmolas para sustento.

AAN – A mídia tem ajudado nesta conscietização?
EM – Muito. A mídia ainda deve se sensibilizar com relação ao adolescente em conflito com a lei. Precisamos agora que a mídia dê o enfoque da matéria jornalística, mas que procure trabalhar o adolescente como uma vítima do sistema, e não apenas como criminoso. Reportar o fato e questioná-lo. Compreender a realidade do adolescente faz com que o jornalista tenha uma concepção totalmente diferenciada, ao invés de divulgar somente o ato infracional em si. Por outro lado, a imprensa tem feito um grande papel no sentido de fomentar na sociedade o trabalho com crianças e adolescentes em risco pessoal e social, mas ainda é preciso que ela trabalhe temas como a redução da menoridade. A miséria, o abandono, o descaso e a violência andam soltos e tem gente ainda querendo prender a vítima. São situações que precisam ser revistas pela mídia para que se possa trabalhar de forma justa.

AAN – E a questão da família. Não se pode trabalhar só a criança, sem pensar na assistência aos adultos.
EM – De fato, não adianta trabalhar criança e adolescente sem pensar na sua família, e é por isso que eu falo da importância da Rede Cidade Criança. Ela integra todas as ações necessárias para atacar o problema de frente. Tem programas pra criança e pra família. O que falta no estado é um programa de atendimento para os dependentes químicos. As ONG’s são importantes neste trabalho, mas precisamos de mais parceiros nesta área. A ação inicial dessas ONG’s ainda é muito tímida.

AAN – Quais são as metas do Ministério Público para o próximo ano?
EM – Queremos em primeiro lugar que todos os municípios possuam conselho tutelar. A Coordenadoria Geral da Criança e do Adolescente vai se encarregar disso. A segunda meta seria executar os programas de retaguarda dos municípios de uma forma ampla para a grande Aracaju. E uma outra meta é a regionalização das unidades de internação do adolescente em conflito com a lei. Já existem propostas de comarcas para a criação de novas unidades mais humanizadas. Não podemos pensar em ressocialização numa única unidade existente no estado.

AAN – Agora como cidadã, a senhora acredita que estes projetos trarão resultados já em 2002?
EM – Sou uma pessoa extremamente otimista. Acredito plenamente no sucesso dos programas, pois estão de acordo com o que diz o ECA. Agora, não podemos ficar desestimulados com qualquer insucesso. Trabalhar com criança e adolescente é alquimia, você está sempre testando. Dá certo com uns e errado com outros. Quem trabalha com a criança e adolescente deve saber lidar com o insucesso. Perder uma batalha não é perder a luta. Existe muita gente com boa vontade de trabalhar, e é por isso que o Ministério Público tem colaborado. Além de fiscal, o MP tem sido parceiro de todos os órgãos que trabalham para mudar a situação destas crianças e adolescentes em situação de risco.[/vc_column_text][/vc_column] [vc_column width=”1/3″][vc_column_text]

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