Comunidade do Vitória de Santa Maria redescobre prazer da escola
Até o ano passado as estudantes Maíra Santos, 15, Tatiane da Silva, 14, e Laurilucy de Oliveira, 15, tinham vergonha de dizer o nome da escola onde estudavam. "Era carteira quebrada, sala suja, sem ventilador", conta Maíra. Assim como elas, 1.683 novos alunos do Colégio Estadual Vitória de Santa Maria, inaugurado em dezembro do ano passado e em aula há um mês, começam a redescobrir o prazer de estudar e de construir, junto com professores e servidores, um novo cotidiano na maior escola pública estadual de Sergipe, no bairro Santa Maria, zona sul da capital.
Por trás do novo prédio com 18 salas, laboratório de Informática e de Química e área para refeitório, alunos como Maíra, Tatiane e Laurilucy já começam a colocar nos cadernos e mochilas lições de preservação da estrutura física e valorização de auto-estima. "Estudar numa escola em que tudo é novo e organizado ajuda bastante no prazer de aprender. No colégio que eu estudava não tinha livros e faltava até telhado. Aqui estou vendo que o ensino é bom, puxado", afirma Tatiane.
Feito por alunos e professores, cartazes coloridos espalhados pelo corredor e dentro das salas de aula com avisos como "Não pise na grama" e "Preserve o que é seu" mostram que essa tabuada a favor da educação não é tirada só. "Todo mundo tem ajudado a construir essa rotina nova, com regras de preservação do patrimônio e de valorizar o que existe na escola", comenta a coordenadora pedagógica Janiely Moura.
A mudança tem mexido com todo mundo e transformado em nota azul temas como disciplina, rendimento e envolvimento, que sempre apareciam em vermelho na caderneta do histórico escolar da comunidade do Santa Maria. "Na minha escola antiga, ninguém tinha respeito, o banheiro era sujo e os alunos brigavam direto. Aqui é diferente, tudo novo. Isso tem ajudado a diminuir a violência e dá até mais gosto de estudar", avalia o estudante Thawan Lima, 14, da 5ª série.
Envolvimento
O início das aulas do Colégio Estadual Vitória de Santa Maria também tem mudado a rotina dos pais dos alunos, que sofriam com um déficit de duas mil vagas para seus filhos, constatado por um censo do Ministério Público Estadual, em 2003. A auxiliar administrativa Iara Santana, 33, já não precisa gastar dinheiro com passagem para que a filha Tatiara Santana, 13, se desloque para outro bairro para estudar. "Como o colégio agora fica perto de onde moramos, dá até para se envolver com a escola e acompanhar mais de perto minha filha. Sinto que ela anda mais interessada pelos estudos", diz Iara.
Em vez de passar uma hora e meia no ônibus para ir e voltar do Colégio Estadual Leandro Maciel, no bairro Castelo Branco, Laurilucy de Oliveira vai a pé, junto com as colegas, para a escola. "É muito melhor estudar perto de casa e dos amigos, sem precisar sair da minha comunidade. Fica mais fácil também de participar das coisas que acontecem no colégio", opina.
Mas não é só a auto-estima dos alunos que tem entrado na cartilha de mudanças do Vitória de Santa Maria. A professora de Artes Sarah Ribeiro, 27, e o professor de Geografia, Daniel Santos, 40, confirmam que o envolvimento de quem tem o giz na mão também tem aumentado. "Noto isso pela minha própria experiência, porque quando descobri que iria trabalhar no Santa Maria não sabia nem onde ficava. Vim para cá pessimista, mas encontrei alunos dispostos e com vontade de se superar. E ter um ambiente de trabalho que colabore é um incentivo a mais a esse esforço coletivo por uma educação de qualidade", disse Sarah.
"Existe uma expectativa e uma motivação de toda a comunidade escolar para que as coisas dêem certo. Estamos passando por uma mudança de consciência que exige mudança de atitude e esse processo é lento, está sendo feito aos poucos. O importante é que sinto nos meus alunos que eles estão começando a sonhar algo diferente para o futuro e já pensam em ser professores, engenheiros, advogados", relata o professor Daniel Santos.
Desafio
De acordo com a psicóloga do Centro Estadual de Qualificação de Pessoal Prof. Antônio Garcia Filho, Elenrose Paesant, a condição do ambiente escolar é decisiva na construção da auto-estima tanto do professor quanto do aluno. "Por estar num bairro de periferia, com estudantes que normalmente têm um histórico de problemas familiares e de aprendizado, essa é uma boa oportunidade para essa nova escola fazer um trabalho de resgate da auto-estima tanto dos estudantes quanto dos professores", avalia Paesant.
O desafio de dinamizar a gestão escolar, elevar o desempenho do aluno e integrar a comunidade vem sendo discutido em reuniões periódicas com professores, servidores, pais e alunos, segundo o diretor do colégio, José Gomes dos Santos Júnior. Gente como a estudante Maíra, a coordenadora Janiely, o professor Daniel e a auxiliar administrativa Iara, que já não sentem vergonha de dizer o nome da escola onde estudam, trabalham ou colocam seus filhos para aprender. Ao menos tem sido assim quando Maíra, Tatiane e Laurilucy descem das suas ruas B12, B13 e B14, em direção ao colégio, e alguém pergunta onde elas estudam. "Agora não fico calada ou enrolo. Digo que estudo ali no Vitória de Santa Maria", afirma Tatiane.
[/vc_column_text][/vc_column] [vc_column width=”1/3″][vc_column_text]- Comunidade do Vitória de Santa Maria redescobre prazer da escola – Foto: André Moreira/ASN