Dia Internacional da Mulher. Razões para parabenizá-las
Por Patrícia Lima da Silva, enfermeira e referência técnica da Área Técnica de Prevenção, Vigilância e Atenção às Violências e Acidentes da Secretaria de Estado da Saúde (SES)
Falar do dia 08 de março dá a sensação que todos pensarão que estaremos cedendo a mais uma data comercial, na qual as pessoas presenteiam com chocolate, mandam flores ou dão os parabéns por ser o “nosso dia”, como se os demais também não o fossem. Há exatamente 155 anos, 129 mulheres tecelãs morriam queimadas trancadas dentro de uma fábrica, em Nova Iorque, porque reivindicavam a redução da jornada de trabalho e igualdade salarial. O dia fatídico passou a ser lembrado em todo o mundo, principalmente a partir de 1975, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) reafirmou a importância da data.
Sem nenhuma pretensão de resgatar toda a história de luta e de conquistas femininas, citarei apenas alguns marcos dos últimos 100 anos: em 1932, o presidente Getúlio Vargas garantiu o nosso direito de voto; em 1948, a ONU lançou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, reconhecendo a igualdade entre mulheres e homens; desde 1962, podemos trabalhar fora e reivindicar direito a herança e a guarda dos nossos filhos em caso de separação.
No início da década de 80, foi aprovado o Projeto de Lei instituindo o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher e nossa Constituição promulgada em 1988 trouxe em seu Art. 5º, inciso 1º: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações”. Na década de 90, o Congresso Nacional aprovou a obrigatoriedade da inscrição de mulheres nas chapas proporcionais (Sistemas de cotas) garantindo o direito às mulheres de estar nas esferas de poder e decisões políticas, chegando à Presidência da República em 2010 com a eleição da presidenta Dilma Rousseff.
Mulher e saúde
No campo da saúde, considerando que somos 51,4% da população sergipana, respondemos sozinhas por 74,3% dos domicílios particulares, no qual o tipo de saneamento é considerado inadequado e semi-inadequado em 52% dos domicílios, e os responsáveis por crianças menores de 5 anos são analfabetos em 28,9% dos casos – nos quais a saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença, e temos muito a ver com tudo que foi exposto até agora.
As conquistas das mulheres no âmbito da saúde somente ganharam força na década de 80, quando foi aprovada a Política Nacional de Assistência Integral à Saúde da Mulher, que permitiu a visão da mulher como ser diverso com necessidades múltiplas. Hoje, temos implantado em Sergipe o Programa de Prevenção de Câncer de colo do útero e de mama; assistência ao pré-natal, parto, puerpério e cuidados com seus filhos até 2 anos, garantida com o Rede Cegonha – inclusive com liberação de benefício durante pré-natal e período da amamentação; As especificidades das mulheres do campo e da floresta e também as pertinentes a raça/cor, também possuem seus programas e políticas; a política Nacional da Saúde LGBT garantindo à assistência integral às lésbicas e transexuais, aprovada no fim do ano de 2011; e para o Enfrentamento às Doenças Sexualmente Transmissíveis DST/Aids, o programa de enfrentamento à feminização está implementado em todos os municípios sergipanos.
Todavia, existem programas de atenção integral que, sozinhos, não dão conta de resolver um problema de saúde de tamanha complexidade quanto o da violência. Em relação à violência, Minayo afirma: “Por ser um fenômeno sócio-histórico, a violência não é, em si, uma questão de Saúde Pública e nem um problema médico típico. Mas ela afeta fortemente a saúde…”. A violência perpetrada contra a mulher é a forma de violação dos direitos humanos mais democrática do planeta, atingindo a todas independente de nacionalidade, grau de escolaridade, faixa etária, raça/cor, credo e renda econômica. É posta pela tradição cultural, pelas estruturas de poder e agentes envolvidos na trama de relações sociais.
No Brasil, a primeira manifestação de enfrentamento às violências contra a mulher ocorreu em 1980, com a criação do lema: “Quem ama não mata com a orientação da criação de Centro de Defesa da Mulher contra Violência Doméstica”, ainda nesta década a 1ª Delegacia de Atendimento Especializado a Mulher foi criada em São Paulo (Deam). Em 2006, foi sancionada a Lei 11.340 conhecida como Lei Maria da Penha, punindo com rigor os crimes contra as mulheres, sendo considerada ‘o marco’ de conquista nesta luta, e continua avançando: o Supremo Tribunal Federal (STF), no último mês de fevereiro, aprovou (exceto por um voto) que o Ministério Público poderá denunciar o agressor em caso de violência doméstica contra a mulher mesmo que a vítima não tenha prestado queixa e para os próximos dias será votado o Projeto de Lei Complementar (PLC) 16/2011 pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), que trata da ampliação da aplicação da Lei Maria da Penha para os namorados.
O Ligue 180 também é outra grande conquista feminina. Em 2011, Sergipe ficou em 4º lugar no ranking nacional de ligações, quando comparado à população feminina.
O Governo do Estado criou a Secretária de Direitos Humanos e Cidadania (Sedhuc) e a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SEPM), que juntamente com a Secretaria de Estado da Saúde (SES) vem fortalecendo e implementando as ações da Rede de Enfrentamento às Violências. No setor saúde, apesar de timidamente, é realizada a notificação de Violência Sexual, Doméstica e outras Violências. Desde 2004, o Serviço de Atendimento às Vitimas de Violência Sexual – localizado na maternidade Nossa Senhora de Lourdes, funcionando 24h, no município de Aracaju – atendeu em 2010 uma média de um caso por dia. Já no âmbito da gestão, foi recém-criado com pouco mais de um ano a Área Técnica de Prevenção, Vigilância e Atenção às Violências e Acidentes, parte integrante da Diretoria de Atenção Integral à Saúde (Dais) com a missão de “Contribuir para o fortalecimento, articulação e qualificação à rede intrasetorial e intersetorial de vigilância, prevenção e enfrentamento às violências no âmbito da saúde e promoção da cultura da paz no Estado de Sergipe”.
O Banco Mundial, no “Relatório sobre desenvolvimento mundial 2012: Igualdade de Gênero e Desenvolvimento”, ratifica durante todo o seu conteúdo que o caminho para o desenvolvimento está na construção da igualdade de gênero e que esta só ocorre através de ações das quais o Brasil e Sergipe já estão aplicando. Prova disto, são os resultados apontados no último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) 2010, no seu Relatório “Indicadores sociais municipais: uma análise dos resultados do universo do Censo Demográfico 2010 – Sergipe” que apontam as conquistas quando comparamos com os 10 anos anteriores e, principalmente, no que temos ainda por avançar.
“Eu tenho convicção de que o século 21 é o século das mulheres. Não para as mulheres serem, de certa forma, contra os homens, mas para as mulheres terem uma participação na vida social, política, econômica e cultural do país ao lado dos homens, tendo o respeito dos homens. Um país que respeita suas mulheres constrói uma nação desenvolvida. Por isso, é muito importante, é uma tarefa de homens e mulheres a luta contra a discriminação da mulher” (Dilma Rousseff – presidenta do Brasil)
A escritora francesa Simone de Beauvoir disse – quando escreveu seu livro “O Segundo Sexo”, em 1949 – que ninguém nasce feminino, o feminino é construído através dos conceitos de forte-frágil, razão-emoção, ação-reprodução, dentre vários outras máximas binárias que foram sendo repassados geração a geração e são até hoje reproduzidos como biologicamente e sócio-culturalmente como inato ao feminino ou masculino, perpetuando as relações de desigualdades de gênero nas esferas de poder e saber.
Lançando um olhar para a máxima de Michel Foulcault: “O que não é regulado para a geração ou por ela transfigurado não possui eira, nem beira, nem lei”. Mulheres e homens, de hoje, que não concordam com o ontem e lutam por um futuro de igualdade de direito e oportunidade de fato, reflitamos sobre o hoje e lancemos um olhar para a educação e comportamento que reproduzimos para os nossos filhos (separando os afazeres, deveres e privilégios por sexo) como também sobre os comportamos enquanto profissionais diante de uma situação de violência, reproduzindo mesmo que inconscientemente o modelo patriarcal de propriedade masculina sob os direitos de sua parceira e seus filhos. Parabéns às mulheres que perderam a vida reivindicando seus direitos, mulheres cidadãs em direitos e deveres, as quais não se rendem à lógica do possível, porque ele foi criado para acreditarmos que não poderíamos sair do lugar.
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